terça-feira, 17 de maio de 2011

Mjöd, o vinho de mel


Uma receita original (G.P.)

"Não sei se cada homem que atacou Eoferwic estava bêbado, mas estaria se houvesse hidromel, cerveja e vinho de bétula suficientes. A bebedeira havia ocupado boa parte da noite e quando acordei encontrei homens vomitando ao alvorecer."

CORNWELL, Bernard. O último reino. 5. ed. Rio de Janeiro: Record, 2009. p. 33


O hidromel (também chamado de vinho de mel) é uma bebida antiga, especialmente popular nos países do norte da Europa, onde é conhecido como mjöd. Basicamente, consiste numa bebida alcoólica fermentada a partir de água e mel.

Para produzir hidromel artesanalmente, tudo que você vai precisar, além dos ingredientes descritos abaixo, é de uma garrafa vazia (preferencialmente de vidro), uma bexiga comum e um elástico.

Os ingredientes são:
- 1 xícara de mel
- Água mineral (suficiente para uma garrafa de vinho, ou cerca de 675 ml)
- 2 sachês de chá de cassis (ou outro sabor)
- Suco de 1 Limão
- 2 colheres rasas de chá de fermento biológico para pão (Saccharomyces cerevisiae)

Não é necessário levar essas proporções tão a sério. Normalmente, usa-se uma parte de mel para duas partes de água, além de outros ingredientes não obrigatórios como especiarias e frutas, dependendo do seu gosto. Neste caso, a receita é de apenas uma garrafa de hidromel acrescido de limão e chá de cassis. Comparada a outras receitas, esta usa uma grande quantidade de mel em relação à água, resultando num produto final com sabor e aroma peculiares.

Como fazer:
Primeiramente, você deve ferver a água e preparar o chá, acrescentando o suco do limão. Desligue o fogo e acrescente o mel. A essa mistura dá-se o nome de mosto.

Deixe o mosto esfriar até a temperatura ambiente antes de acrescentar o fermento biológico. Mexa-o bem e prepare-se para engarrafar. Antes, não se esqueça de higienizar a garrafa muito bem, afinal o hidromel irá permanecer nela por um longo tempo e você não quer que outros microorganismos além daqueles contidos no fermento se desenvolvam.

Feito isso, acrescente o mosto à garrafa e use a bexiga para fechar a abertura, fechando-a com o auxílio do elástico como mostra a figura.


O elástico e a bexiga servirão para que o ar do ambiente não entre em contato com o interior da garrafa. Uma vez que a abertura estiver lacrada, todo o oxigênio sobressalente no interior será consumido pelos microorganismos do fermento. E é aí que a mágica acontece: nesse ponto, o fermento começará a quebrar as moléculas de açúcar do mosto em gás carbônico e álcool. Assim, durante a fermentação, o nível alcoólico da bebida subirá até certo ponto, até que o processo se torne mais lento e finalmente pare.

Você saberá que está funcionando porque a bexiga irá inflar, e é importante que você não abra a garrafa durante todo o processo. Guarde-a num ambiente escuro e deixe o hidromel maturando por alguns meses. Depois de algum tempo, você perceberá que o fermento irá decantar no fundo da garrafa.

Quando você finalmente abrir a garrafa, filtros de papel podem ser utilizados para realizar a filtragem da bebida e obter um produto mais claro. Tome cuidado para que o fermento decantado não se misture novamente ao líquido, o que tornará o hidromel turvo.

E é isso aí, o que você terá em mãos é uma bebida artesanal muito semelhante àquela que os vikings e outros povos nórdicos saboreavam há séculos. (G.P.)

sábado, 7 de maio de 2011

O senhor que sabia voar



Durante sua vida sexagenária, ele já havia lido tantos livros de fantasia quanto eram necessários para saber que pessoas podem, de fato, voar. No entanto, ele já havia lido também muitos livros sobre aviação, física e anatomia das aves, tantos quanto eram necessários para saber que seres humanos simplesmente não têm a aerodinâmica necessária.

Mesmo assim, ele sabia que voar era possível, pois já havia conseguido. Várias vezes, na verdade. Tudo o que ele precisava fazer era estender a cabeça para a frente, abrir os braços e saltar na direção da brisa. Depois que já estava no ar, bastava guiar-se na direção pretendida e, de alguma forma, manter o corpo leve. Não era um processo natural, é claro, como ocorre para os pardais, os colibris e as gaivotas; nem sempre ele conseguia levantar voo, e às vezes esbarrava numa árvore ou num prédio. Mas, durante as décadas, ele aprendeu a controlar altitude, velocidade e direção.

Ninguém nunca o havia visto voando. Quando ele era criança, talvez aos cinco ou seis anos, todos os seus voos aconteceram quando nenhum adulto estava por perto. Sua mãe, obviamente, não acreditava que ele pudesse voar, mas era suficientemente inteligente para sorrir com bondade e encorajá-lo nas aventuras que considerava imaginárias.

Depois de adulto, foi a vez de sua esposa desacreditá-lo. “Como pode um banqueiro respeitável, com uma imagem a zelar na sociedade, manter sonhos juvenis como esse?”, dizia ela. Tudo o que ele fazia em resposta era sorrir jocosamente e dar-lhe um beijo na testa, e continuava voando naqueles momentos em que manter a imagem perante a sociedade não era uma prioridade. Voar era uma das duas coisas que lhe davam mais prazer na vida. A outra era observar os elfos que habitavam a árvore em frente à sua casa.

Os elfos eram criaturas extraordinárias. Eram muito similares a humanos, tanto em tamanho como em aspecto, mas algo neles denunciava uma presença quase extraterrestre. Eles emanavam um brilho pálido, como estrelas em forma humanóide, e estavam sempre absortos em algum tipo de labor misterioso, sistemático, que o senhor que sabia voar observava à distância. Envolvidos na metodologia de seu trabalho, os elfos caminhavam graciosamente sobre os galhos da árvore. Às vezes, o senhor que sabia voar tentava comunicar-se com eles, mas eles sempre o ignoravam, e quando ele chegava perto demais, corriam para dentro das folhagens, desaparecendo como se nunca tivessem estado ali.

Os elfos da árvore eram os únicos que o senhor que sabia voar via de perto, mas ele sabia que existiam outros elfos em algum lugar. E os elfos também sabiam voar. Às vezes, ele via grandes grupos de elfos, talvez trinta ou quarenta deles, todos usando capuzes brancos, voando a grandes atitudes de braços abertos sob as nuvens cor de cobalto, sempre do Oeste para o Leste. Ele não sabia aonde os elfos iam, mas gostava de imaginar uma terra de elfos acessível apenas àqueles que sabiam voar. Um dia, talvez, ele voaria até lá.

A primeira pessoa que, de fato, acreditou que ele era capaz de voar foi o seu neto de quatro anos. Quando ficou sabendo das façanhas do avô, nunca fez pergunta alguma em tom de dúvida. “Deve fazer muito frio lá em cima, vovô”, foi tudo o que ele disse. Em seu aniversário de 61 anos, ganhou do neto um cachecol de lã vermelha, para que ele usasse quando estivesse voando. Foi o melhor presente que alguém já havia lhe dado.

Naquele momento, porém, apesar de estar muito feliz, ele já havia começado a perceber que o tempo pode ser um companheiro deveras cruel. Dores terríveis nos joelhos tornavam difícil tomar o impulso inicial na hora de voar e o ar gelado fazia mal aos seus pulmões. Um dia, ele começou a temer que nunca mais conseguisse sair do chão. Resolveu, então, ensinar ao neto como fazê-lo. Durante longas tardes de outono eles praticavam, e às vezes observavam juntos os elfos que passavam voando numa formação em V durante o crepúsculo.

Um dia, porém, tudo acabou subitamente. O senhor foi dormir, depois de tomar o seu chá com cinco gotas de limão, e nunca mais acordou. Seu coração simplesmente recusou-se a continuar fazendo o seu trabalho. Todos pensaram que ele havia morrido, e ficaram muito tristes. Seu neto, no entanto, era o único que sabia que, na verdade, ele havia ido voar com os elfos entre as nuvens de cobalto, onde o joelho não doía e não havia a imagem de banqueiro respeitável a zelar, com o cachecol vermelho ondulando ao vento, para sempre. (G.P.)